Por que o mal é sedutor? Virgínia Leal

 



            Se você não queria, mas fez, quem fez então? Por que o mal seduz? Por que somos atraídos por notícias trágicas e dramáticas? Porque o enredo das novelas líderes de audiência giram em torno de conspirações, intrigas, maledicência e emoções descontroladas? Por que os filmes campeões de bilheteria tem por temas crimes e violência? Por que, quando estamos em multidão, somos inclinados a seguir a tendência negativa do grupo e a fazer o que não faríamos se estivéssemos sós?

 

            Para refletir sobre essas perguntas é preciso retomar o tempo da infância.

Na primeira infância, o mundo da criança é a mãe. À medida que ela se descobre como indivíduo, passa a ter uma percepção autocentrada da vida. É tarefa dos pais ajudá-la a construir sua personalidade de forma a incluir  os outros nessa visão de mundo. Na missão disciplinadora dos pais, em relação aos instintos e tendências egóicas, os pais despertam no filho desconfiança e medo, e assim é formada a consciência sobreposta na psique infantil, que continua a atuar na fase adulta.

 

            Essa consciência é a instância repressora, exigente, inflexível, implacável e cega de discernimento. Então a pessoa vive um conflito entre obedecer esse comando cruel e recalcar suas emoções e sentimentos, ou rebelar-se e experimentar culpa e medo.

 

            Então todos nós temos uma caixa de pandora, onde mantemos prisioneiros os defeitos, as falhas e defeitos de caráter, as emoções que tememos, aquilo que vemos como imperfeição. Tiramos tudo isso de nosso campo de visão, mas não evitamos o clima geral, a perspectiva emocional de egocentrismo.

 

            Ocorre que tudo que é recalcado encontra o caminho de expressão, e aí, num ato falho, diante de um estímulo recebido, essa caixa de pandora é aberta e tudo que está lá chega de forma intensa e exagerada. Tomados por culpa, vergonha e medo, empurramos as más inclinações de volta para a prisão, para aliviarmos a consciência, num infindável ciclo vicioso.

 

            Somos seduzidos pelo mal porque não olhamos de frente para ele, porque o reprimimos, e esses estímulos através das notícias e diversão encontram ambiente fértil para a associação das más tendências com o prazer, sem que a culpa e a vergonha nos domine. Ocorre que ao fazer isso, estamos dando força ao mal, que emergirá involuntariamente por não termos domínio sobre ele. O mal nada mais é que a ignorância, a ignorância que insistimos em alimentar não olhando para todas as instâncias imaturas da consciência que precisam ser desenvolvidas. Ignorância da nossa essência divina e da sabedoria que lhe é inerente.

 

            Precisamos conhecer e aprender sobre esse eu ignorante que chamamos de eu inferior, esse aspecto que não cresceu, que não foi educado. Mas para isso, necessário observar a consciência falsa e sobreposta, portanto imatura, para transformar os conceitos equivocados, as crenças, a rigidez e a dureza dessa instância repressora. À medida que entendemos como ela atua, menos nos submetemos a ela e mais acessamos a verdadeira consciência orientadora. E mais permitimos a expressão do eu inferior para que possa ser acolhido e integrado ao eu real, não o reprimindo, nem atuando a partir dele. Dessa forma, menos seremos surpreendidos por atos impulsivos e descontrolados próprios de sua natureza.

 

            Pode parecer estranho afirmar que a disciplina liberta. Se não formos capazes de dar contenção aos instintos primitivos distorcidos pela imaturidade do ego, não seremos livres para fazer escolhas a partir do eu real.

           

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