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Mostrando postagens de janeiro, 2025

As coisas são como são

  Quando eu era espírita, atribuía à influência espiritual tudo que me acontecia. Então eu fazia tratamento espiritual e orava. Não me dava conta de que esse tipo de aproximação só acontece se eu me nivelar à frequência desse tipo de energia.   Hoje eu continuo a acreditar na possibilidade de influência espiritual, mas antes de chegar a essa conclusão busco uma explicação racional pelas desventuras, contratempos, dissabores, adoecimento físico.   Há coisas que acontecem comigo que podem acontecer com qualquer um, não sou especial aos olhos de Deus.    Se eu ficar procurando uma razão de ser para tudo, certamente tentarei transferir minha responsabilidade aos outros ou ao acaso.   E se for o caso de interferência espiritual, buscar a causa emocional que contribuiu para isso é a solução para me elevar energeticamente. 

Esqueletos no armário

    “O sintoma é uma mandala pendurada no nosso pescoço, todo mundo está vendo. Todo mundo está vendo menos a gente.” psi.lucascarneiro   Quando eu me movia a partir da minha imagem idealizada, não era capaz de perceber o quanto as emoções negativas se acumulavam em mim. Eu as abafava, me retirava emocionalmente, fingia que estava bem.   Com a maturidade e muito trabalho terapêutico percebi o tanto de esqueleto que guardava no armário e o quanto eles pressionavam para sair da forma mais desordenada, em forma de sintomas. Todo mundo via, menos eu. Os desejos são permeados por afetos negativos.    Os afetos positivos e negativos coexistem, se misturam, muitas vezes se confundem. Como Lucas carneiro disse: “leva um tempo para as fraturas se tornarem marcas”. Algumas continuam sendo fraturas e temos que conviver com elas da melhor forma possível.    Mas enquanto não as olhar, elas continuaram fazendo estrago em forma de repetição de atitudes destrutiv...

O que machuca, afasta

    “Se alguém tem a coragem de dizer que algo que você faz dói, machuca, é apenas para você ser consciente e pensar em como você pode deixar de ter essa atitude.” fernandanetto.psi   Eu tinha uma amiga que por mais que eu dissesse que o que ela fazia me magoava, ela não se dava conta, dizia que ia pensar, e continuava a agir do mesmo modo.   Tive um marido com o mesmo comportamento, não levava a sério meus sentimentos.    Queria que eles entendessem que isso não é sobre eles e sim sobre mim, de como me senti afetada, mesmo que para eles isso fosse algo sem importância.    Ainda que eu os perdoasse, como não via neles a intenção de mudar, de evitar de fazer o que me feria, acabei por me afastar, primeiro emocionalmente, depois fisicamente.    Se sou machucada com o que os outros fazem, certamente faço algo que machuca e não me dou conta. Preciso me observar, já que não tive a bênção de alguém me falar o que o magoa.    Cuidar i...

Entre devaneio e divagação

  “Eu não sou uma sonhadora. Só devaneio para alcançar a realidade.” Clarisse Lispector   A vida toda oscilei entre devaneio e divagação. Uma fala pode ser o gatilho que me transportará a lembranças ou a pensamentos encadeados sem fim.  É preciso que algo me puxe de volta para interromper essa linha de pensamentos quase hipnótica.    Outro estímulo ou gatilho pode me conduzir a um mundo imaginário pleno  de encantamento, a um enredo de faz  de conta, que me preenche de algo indescritível e suave, como águas mansas de um lago.    O que o devaneio e a divagação têm em comum é o dom de me tirar do presente  e me transportar a uma dimensão fora  do tempo, onde as lembranças criam vida e a fantasia é tão real que poderia tocá-la.   Sei que a divagação me tira do foco  e o devaneio me afasta o pensamento lógico. Mas é através deles que encontro respostas para meus questionamentos mais aflitivos e me sossegam o coração. Sempre qu...

Crescimento na divergência

  Crescimento na divergência   Houve um tempo em que eu não aceitava uma opinião divergente da minha, procurava alguém que concordasse comigo.   É bom conversar com meus pares, confirmar o que penso, isso me dá prazer por validar meu ponto de vista.   Não estava disposta a entrar em contato com pensamentos divergentes, tinha receio de que desmoronasse meus alicerces de entendimento e ficasse no vazio.    Mas o verdadeiro enriquecimento está em ouvir o novo e até contraditório. Só assim posso ampliar meu repertório de conhecimento ou questionar seu conteúdo.   Se minha convicção está de acordo com minha verdade pessoal e ainda não estou pronta para examiná-la, melhor ser fiel a ela, ainda que faça sentido o que o outro propõe.    É na divergência que é possível revolver os alicerces contaminados por conclusões equivocadas decorrentes de reações emocionais. Mas é inconsequente aceitá-la, se estiver conflitante com aquilo que acredito. 

Liberdade

  “Liberdade é fazer o que não se quer” Kant   É imatura e inconsequente a pessoa que só quer fazer o que quer. Só fazer o que quer a torna escrava do desejo, impulsiva e tendente a pulsões deletérias.    Liberdade é a capacidade de fazer escolhas criteriosas e adequadas para cada situação. E quando falo de adequadas não quero dizer convenientes ou que seja boa apenas para si, a escolha deve considerar também o outro.    Não é livre quem tem apego exagerado às coisas ou a alguém. Quem é dependente emocional. Quem não tem domínio sobre a própria vontade, quem tem emoções desgovernadas.     Não é livre quem não se conhece, e por não se conhecer é surpreendido tendo atitudes que reprova vindas do inconsciente.    Liberdade importa em assumir a responsabilidade por seus atos. É livre quem tem domínio sobre si mesmo, quem está disposto a pagar o preço por suas escolhas.  Só é livre quem não se submete aos caprichos, quem não aliment...

Perdão

    “Perdão não é permanecer junto.Todo perdão é um fim. É o fim de como você conhecia aquela pessoa.” Fabrício Carpinejar   Entendo o que Carpinejar diz. Perdoar é o fechamento de um ciclo. Quando eu sofri uma traição, voltei-me para mim e refleti o quanto eu contribui para isso, seja estando cega para não ter que decidir, seja por negligenciar a relação.    Quando assumi minha parcela de responsabilidade, eu perdoei e dei mais uma chance. Quando a traição se repetiu, em perdoei, mas neguei uma segunda chance, porque a confiança foi violada.   O perdão foi o começo do fim. Ainda via aquela pessoa da mesma forma, com a diferença que agora eu sabia do que ela era capaz. Mas não havia mais como permanecer na relação.    O perdão é a liberação de mágoa e ressentimento que só mal traz a quem sente. Perdoar independe de a pessoa merecer ou não. Mas acaba a forma como eu a via.   

Saber o que quer

    Se te apetece esforçar, esforça-te. Se te apetece repousar, repousa. Se te apetece fugir, fuja. Se te apetece resistir, resista. Mas saiba bem o que te apetece  e não recue ante nenhum pretexto, Porque o universo se organizará para te dissuadir. Zarastustra    Já o proverbio judaico diz: “cuidado com o que desejas, pois poderás ser atendido.” Penso que o que essas duas mensagens tratam é do cuidado que se tem que ter para saber o que de fato deseja, antes de intencionar e de se mobilizar nessa direção. A primeira fala dos obstáculos que se enfrentará para conseguir o intento. A segunda diz que, mesmo que você consiga o que quer, poderá ter consequências desastrosas.   A maioria das pessoas não sabe o que quer e age por impulso. Não analisa os prós e os contras, não avalia o custo-benefício, nem se o que se quer trará prejuízo a outra pessoa.   Minha tendência é agir por impulso, e já me arrependi pela escolha que fiz. É como se eu temesse demorar e...

Desajustada

    Eu sempre me senti inadequada, não conseguia me enquadrar a um grupo, a uma religião, porque eu transbordava às regras, aos conceitos. Sempre fui questionadora e nem sempre tive respostas. Nunca me senti pertencendo a um grupo, a esse mundo, não entendia por que as coisas tinham que ser do jeito que são.   Estão fadados à mesmice, à mediocridade aqueles  que se encaixam aos padrões preestabelecidos.    Isso me faz lembrar uma ocasião em que reclamei de alguém que estava furando a fila, e a reação das outras pessoas não foi de me apoiar, mas de me olhar com censura. São pessoas que se adaptam ao que está errado porque é o comum. Então elas aceitam que alguém fure a fila, porque também furam. A falta de educação social generalizou-se e tornou-se um padrão.    Pessoas como eu são consideradas desajustadas, à margem do padrão. Depois de muito trabalho mental e psíquico entendi que são os desajustados que oferecem uma nova perspectiva sobre tudo, q...

Ofensa

  Ofensa é uma agressão verbal que tenta atingir a honra, moral ou dignidade da vítima.    Nesses tempos de ausência de freios, de falta de contenção sobre o que se diz,  ela se tornou comum. Quando é feita em público, tem a intenção de envergonhar, humilhar e desqualificar  o agredido.   Ouvi Cortella dizer que há uma forma de evitar se sentir ofendido. Se a acusação for verdadeira, não tem por que se ofender. Se for falsa, não lhe diz respeito.    Se eu não me sinto atingida, ela volta para o agressor. Não é uma tarefa fácil, até porque há sempre um público que acolhe a acusação como verídica.    Se forem pessoas de seu círculo de conhecimento e amizade, significa que nunca foram suas amigas, ou são imaturas ao se omitir em formular sua própria opinião.    O tempo e minha atitude vão confirmar ou contradizer a ofensa. De uma forma ou de outra, só ficará comigo quem me conhece e me aceita do jeito que sou. 

Reconhecimento na alteridades

    “O outro diz de nós, diz mais dele do que de nós.” @carolinasmilestores   Tenho falado da importância da socialização, da vinculação, da convivência, porque o humano é um ser gregário. Ao estar com o outro posso ampliar meu repertório de informação, expandir a minha percepção, exercitar a tolerância, a capacidade de escutar algo que destoe de minha forma de pensar.   Preciso do outro porque tenho sede de pertencimento, preciso me conectar com meus pares, com minha família espiritual.    É difícil perceber nas pessoas aquilo que me é estranho. Em outras palavras, é mais fácil ver aquilo que me é familiar. Quando me afeto com o que vejo no outro isso sinaliza autorreconhecimento.    Partindo do pressuposto de que temos todos os defeitos e qualidades em graus diferentes, é comum ser afetada pelo que identifico no outro. A estranheza decorre do fato de não ter ainda reconhecido determinada falha ou talento em mim.    Aquilo que identific...

Importância dos limites

  I   Mamãe era extremamente cuidadosa com a casa em que morávamos. Além de mantê-la limpa, ela mesma a pintava, fazia pequenos reparos hidráulicos e elétricos, nunca deixava os consertos se acumularem e com frequência mudava os móveis de lugar. Assim, a energia da casa era sempre renovada.   Esse zelo foi herdado pelos seus filhos, que aprenderam a valorizar a importância de ter um teto que os abrigue, paredes que os proteja. É nos limites de onde habito que encontro aconchego e segurança.    O humano precisa de limites para se motivar a se expandir. Imagine que tipo de pessoa eu seria se meus pais não tivessem me dado limites, daria vazão aos maus instintos, ao egoísmo, seria inconsequente e viveria em constante risco.   Não é sem razão que o humano precisou viver contido em um corpo físico, com forma própria que o distingue dos demais.   O infinito é algo que ninguém consegue ainda lidar. Quando viajei de navio, me perturbou olhar para os quatro can...

A ânsia de ter e o tédio de possuir

  A maioria de nós tem uma relação com as pessoas e coisas tão deletéria, a ponto de inviabilizá-la. E isso tem a ver com a pretensão de satisfazer a pulsão do desejo. Melhor dizendo,  na ânsia de preencher o vazio do desejo, desenvolvemos o sentimento de posse generalizada de tudo.   Se vemos uma flor, queremos tê-la no jarro, temos o impulso de comprar algo bonito que vimos na vitrine. Se visitamos um lugar belo, queremos morar nele.    A posse nas relações humanas tem título: meu vizinho, namorado, marido, colega, pais, filhos, tudo é posse. O ciúme nada mais é do que a reação à ameaça de perder a posse.    O amor baseado na posse delimita o espaço, impõe regras. O sentimento de posse é confundida com afeto.    Essa forma de se relacionar é inviável, porque na medida em que “adquirimos” o objeto de desejo, anulamos o desejo de tê-lo.    Nenhuma relação é saudável, se não há liberdade de se transitar em outras relações, se há...

O desafio do idoso em morar só

  Moro só por opção. Na minha idade fica difícil me adaptar aos hábitos e costumes diferentes dos meus, em especial os de pessoas jovens. Gosto de acordar e dormir cedo, me acostumei com o silêncio, e de ter todos os ambientes da casa disponíveis para mim.    Mesmo assim, gosto da minha irmã estar morando uma temporada comigo enquanto seu apartamento está sendo reformado. Temos muita afinidade na forma de pensar e de hábitos.    Já tomei medidas de segurança, como um serviço de alarme que aciona pessoas da minha rede de proteção, e câmeras disponíveis para elas acessarem em caso de necessidade.    Tenho uma faxineira semanal que faz o serviço mais pesado e eu só faço a manutenção nos demais dias. Cuido de minhas plantas e mantenho a pia limpa.    Como tenho déficit de atenção, já deixei panelas queimar no fogão, mas pretendo cozinhar na presença da faxineira, ela cuidará de acompanhar as panelas no fogo.    Estabelecer rotinas que m...

A repetição no trauma

  “O trauma tem a característica de impor uma mesma lembrança.” Crhistian Dunker    Trauma emocional é a resposta a eventos angustiantes que a mente não consegue lidar. O trauma cria uma imagem em forma de lembrança cristalizada, ou seja, a mente não é capaz de trazer alternativas ao acontecimento, novas formas de interpretar o ocorrido.    Para diminuir o impacto gerado pelo evento, a mente o joga no inconsciente, e quando a memória chega, vem distorcida por não ter sido elaborada adequadamente. Entre as imprecisões na lembrança está a fantasia, e a interferência sensorial dos afetos.   Tudo que é reprimido uma hora vence as barreiras e se manifesta. Ainda que esteja no inconsciente, a mente repetidamente cria situações semelhantes, na tentativa de confirmar a impressão registrada, ou para dar um novo desfecho.    É preciso se abrir para a possibilidade de que a lembrança pode não ser fidedigna à ocorrência, por estar comprometida por tais fatore...

Futuro diferente

    “Aí em pego o passado, a dor que ele me deixou e me comprometo a fazer um futuro diferente.” Padre Fábio de Melo   O passado me trouxe grandes aprendizados, além de me fortalecer e me trazer resiliência. Quando estou passando por uma experiência que me traz  sofrimento, é comum eu rotulá-la de algo ruim. Depois de algum tempo, quando já saí da reação emocional e é possível revisitá-la, posso avaliar a minha contribuição no desfecho desagradável, e escolher não repetir o erro. Dessa forma, posso fazer um futuro diferente, a partir da nova postura no presente.    Muitas vezes, a dor perdura porque quero dar o próximo passo, arrastando comigo algo que já deveria ter soltado, abrir um novo ciclo sem fechar, sem me despedir, sem me desapegar do anterior. O passado precisa ficar no passado, para abrir espaço para o novo. Enquanto eu insistir em ir pra frente, sendo puxada para trás, não saio do lugar.    Na verdade, costumo valorizar mais as co...

Imagens

  “Você gosta da ideia que você tem de mim, do que você acha que eu sou” Clovis de Barros    Hoje recebi uma mensagem elogiosa de ex-colega de trabalho que me deixou desconcertada, porque enalteceu qualidades que procuro praticar, como se ele só visse isso em mim.    Já é de conhecimento geral que o apaixonado não enxerga a pessoa por quem ele se apaixonou, o que vê é uma imagem projetada, muitas vezes idealizada do que ele queria que o parceiro fosse.    O que a maioria não sabe é que nos relacionamos com a imagem que temos do outro, seja namorado, amigo, chefe ou professor.    Clovis de Barros diz que vemos no outro aquilo que somos: “você me vê amável porque você é amável”. Faz sentido, mas vou além. Vemos também o que gostaríamos de ser ou o que desejamos que o outro tenha.   Essa imagem que criamos é causa de decepção, de desentendimento e até de separação. Isso acontece porque a imagem não se sustenta ao longo do tempo e, mesmo que...

Estar só e sentir-se só

    “Se você se sente só quando está só, provavelmente está mal acompanhado.” Jean- Paul Sartre    Nem sempre estar só me faz sentir só. Isso acontece quando não invoco  a minha própria companhia.    Já quis me encaixar num quebra-cabeça ao qual não pertenço, no afã de sair da solidão. O resultado foi que continuo me sentindo só, mesmo rodeado de gente.    A solidão se converte em angústia toda vez que me desconecto de mim mesma. Não quero saber quem sou, por medo do que posso ver em mim.    Mas todas as minhas máscaras estão rotas e perdi a agulha, a linha, e a mão que as costurem. Perdi o jeito de me ocupar para não sentir, de me enganar,  de fazer da solidão substituta das reais emoções.    A solidão genuína é aquela que me mobiliza ao encontro, que tem curiosidade em conhecer o outro, que quer oferecer o que tem, que não mendiga atenção.    Solidão que me dá consciência de quem sou. Que sabe de mim e do ...

Entre devaneio e divagação

  “Eu não sou uma sonhadora. Só devaneio para alcançar a realidade.” Clarisse Lispector A vida toda oscilei entre devaneio e divagação. Uma fala pode ser o gatilho que me transportará a lembranças ou pensamentos encadeados sem fim. É preciso que algo me puxe de volta ao presente para interromper essa linha de pensamentos quase hipnótica. Outro estímulo ou gatilho pode me conduzir a um mundo imaginário pleno de encantamento, a um enredo de faz de conta, que me preenche de algo indescritível e suave, como águas mansas de um lago. O que o devaneio e a divagação têm em comum é o dom de me tirar do presente e me transportar uma dimensão fora do tempo, onde as lembranças criam vida e a fantasia é tão vívida quanto a realidade. Sei que a divagação me tira do foco e o devaneio me afasta do pensamento lógico. Mas é através deles que encontro respostas para meus questionamentos mais aflitivos e me sossegam o coração. Sempre que volto ao presente sou outra pessoa, com percepção ampliada e des...

Rotação e Translação

  Quando amanhece o dia, completo o ciclo em torno de mim mesma. Sem perceber, giro em torno do meu eixo, assim como a Terra. Esse movimento me renova, amplia a percepção de mim mesma. A cada ano completo o movimento espiralado em torno do meu sol interior, e me aproximo mais dele. Próximo a completar o ciclo é o momento mais difícil, porque já recebo a influência do novo e preciso me desapegar da etapa que findou. Sofro por resistir a dar o salto no vazio, e toda sorte de eventos desafiadores me acometem. Quando entendo o que preciso fazer, vem a calmaria. Olho para trás, a sensação de bem-estar pelo dever cumprido me envolve, mesmo que tenha sido aos trancos e barrancos, mesmo que tenha deixado alguma ponta solta, sei que fiz o melhor que pude fazer. Me lanço no desconhecido e inicio, confiante, a próxima translação porque tenho meu sol como guia.

Resgate

    “Não importa a quantidade de naufrágios que você tem ao longo da vida, mas sim a capacidade de se resgatar.” Filósofo alemão    Quando eu era jovem, desejava ficar logo idosa, para me livrar do peso de minhas próprias expectativas e às dos outros. Havia uma exigência estética que seguia com rigor.   Quantas vezes eu sucumbi à angústia,  à depressão, mas nunca me desesperei, porque sabia o caminho de volta, sabia como me resgatar.   Com o tempo percebi que a dor  e a alegria caminham juntas,  um contraste necessário, sem  o qual eu ficaria estagnada.   Agora, idosa, liberei a pressão que fazia sobre mim mesma, afrouxei a rigidez e a teimosia. Apesar de ainda sentir o peso daquilo que ainda não transformei, percebo a alteridade da leveza que me é inerente e que me ajuda a emergir após os naufrágios que não deixaram de existir.   

Que lição posso tirar disso?

  “... Nessa hora, a gente encontra aquilo pelo que viveremos quando percebe aquilo pelo que morreremos.” Débora Falabella   Quando as coisas se complicam, quando sofremos revezes costumamos nos desesperar e não encontrar saída, culpar a vida, o destino, perguntarmo-nos: “por que eu?”   Se ao invés disso, aceitássemos o momento desfavorável, as perdas e nos perguntássemos:” que lição posso tirar disso?” as nuvens se dissipariam, a mente ficaria mais clara, encontraríamos solução, mesmo antes de encontrar a resposta.   Se entendermos que nada nos acontece que não nos esteja destinado e tirarmos um aprendizado de tudo, a vida seria mais fácil e fluida, descobriríamos o que é mais importante na vida, descartaríamos o supérfluo e viveríamos mais simples e verdadeiros.    No espaço de silêncio e meditação é possível “perceber pelo que morreríamos, quando encontrarmos aquilo pelo que viveremos.” 

Utilitarismo

    “ O egoísmo pessoal, o comodismo, a falta de generosidade, as pequenas cobardias do quotidiano, tudo isto contribui para essa perniciosa forma de cegueira mental que consiste em estar no mundo e não ver o mundo, ou só ver dele o que, em cada momento, for susceptível de servir os nossos interesses. ”  ―  José Saramago   O utilitário prioriza a utilidade das coisas. Toda relação que tem é pautada na serventia das coisas ou das pessoas.   Em sendo assim, pessoas e coisas “valem o quanto pesam.” Coisas e pessoas não têm valor em si mesmo, mas se e enquanto for útil.    Com a instalação do consumismo,  o germe do utilitarismo contaminou  a maioria das pessoas.    Chega ao extremo das relações afetivas  serem pautadas no que o outro é capaz de oferecer, o afeto fica em segundo ou terceiro plano.     Assim como qualquer produto que não serve mais para o uso, as pessoas são descartadas quando deixam de aten...

O peso de quem sou

    “Porque muitas coisas que nos são próprias são também pesadas de levar... É preciso aprender a suportar a si mesmo, e não a rondar fora de si.” Nietzche    O que me pesa não são as amarguras da vida ou o excesso de tinta  com que me pintam.    O que me pesa é a carga da angústia que carrego nos ombros, a sombra soturna  que me cobre, os nãos que me acorrentam.   O que me pesa sou eu mesma em minha pior versão, o peso de chumbo nos pés, que não posso ignorar ou me livrar porque me é inerente.    A carga do que sou torna-se mais leve á medida em que a suporto, apesar do apelo para rondar fora mim. O que me dá asas é o sonho, o imaginário e o riso.

Convivência

  “A vida é convivência, o outro se impõe o tempo todo ... os outros estão sempre interagindo conosco” Clovis de Barros   Os individualistas aparentemente não sentem falta de interação, e há quem diga que não devo dar tanta importância à opinião alheia. Concordo em parte.   O humano é um ser gregário, por isso precisa pertencer a um grupo, a uma comunidade, encontrar os seus semelhantes.    Preciso do olhar do outro para me construir e reafirmar minha identidade, para me ver pela lente dele. É claro que preciso tomar consciência de quem sou, para não me deixar influenciar ou não ser dependente desse olhar, que pode estar distorcido, mas preciso ter o outro como referência, no mínimo, para saber se estou me expressando com fidedignidade para mundo, ou estou passando uma imagem errada minha. O outro é eficaz em me revelar os pontos cegos.   Estou o tempo todo interagindo com o mundo em algum nível, estabelecendo conexões variadas, ainda que não me vincule....

Comprometimento

    “O ser humano, ele tem uma dificuldade imensa de comprometimento... suar a camisa é você entender que para tudo você vai ter que arregaçar a manga.” @psipamela   Sempre achei que era mais comprometida com o relacionamento que meu parceiro. Agora entendo a dinâmica nas minhas interações afetivas. Começava com a sedução, eu encantava pelo que eu fazia pelo outro. Quando  o vínculo se estabilizava eu continuava dando, na esperança de que ele agisse como eu queria. Quando isso não acontecia, o que é de se esperar,  eu retirava tudo que vinha de mim e começava a me desinteressar por ele.    Deixava um pé fora do relacionamento,  e achava que tinha uma segunda opção, caso decidisse me separar. Na verdade, ninguém em sã consciência vai ficar na prateleira esperando por ninguém.    Agora entendo que atraímos o parceiro por afinidade, a maioria das vezes dos aspectos negativos de cada um.  Não podia esperar um parceiro comprometido se eu...

Humor

  Humor   “O humor tempera o choro”. Ariano Suassuna   Antigamente tinha a crença de que não podia misturar o choro com o riso, para mim não fazia sentido rir se estava triste.   Ariano me representa nessa fala. O riso é um ato de resiliência, de rebeldia à sisudez. Quando estou triste, gosto de ver vídeos de humor que expõe o ridículo, os micos, a surpresa. Quando consigo rir de minha própria desgraça, tudo se torna mais fácil.  Suassuna dizia que o riso a cavalo e o galope do sonho eram as suas armas para lutar contra o desespero, a tristeza e a morte.    Lembro de coisas que me fizeram rir,  coisas engraçadas e tolas, rio sozinho. O riso já me salvou mais de uma vez, eu era mais feliz quando tinha o riso frouxo.    Preciso do riso para sair da seriedade que sempre me acompanhou, para me dar leveza e fluidez. O riso me quebra a rigidez, me liberta, me dá asas.    Como diz Ariano: “ No meu ver  o ser humano tem duas ...