O Poder Destrutivo do Discurso - Virgínia Leal

 

                 A filósofa Viviane Mosé afirma que o que nos move não é a verdade, o que nos move é a ilusão.  Precisamos desesperadamente da ilusão. Ninguém quer despertar para a realidade da morte. Então, para não estar cara a cara com ela, tentamos enganá-la com a fantasia de eterna juventude. A velhice lembra a proximidade da hora derradeira. Colocamos a vida sob uma redoma construída por ideias, explicações, teorias e justificativas que nos dão falsa segurança, a sensação de domínio e controle sobre ela. 

 

            Nesse contexto, o pensamento está a serviço da ilusão. Valendo-se desse estado de vulnerabilidade humana provocada pela angústia que as vicissitudes e infortúnios provocam, algumas mentes afortunadas de inteligência, usam de seu poder argumentativo para persuadir as pessoas de que suas ideias e promessas são a solução e a resposta para todos os problemas. Então há uma combinação perfeita entre o poder de convencimento do interlocutor e o desejo de ser convencido do ouvinte. O discurso só prospera pelo auto-engano de quem a ele se submete.

 

            E o que é o discurso?  É um instrumento de controle e de poder. É aquilo que está por trás da ideia transmitida. É a intencionalidade persuasiva para convencer o ouvinte da veracidade, legitimidade e bons propósitos da ideia transmitida através de afirmações ou enunciados. O objetivo é influir no raciocínio, a mais das vezes provocando comoção. O discurso defende uma ideologia favorável a quem a manobra, cuja narrativa é organizada de forma a ocultar isso. Ele induz o ouvinte a crer que ao adotar essa ideologia estará defendendo seus interesses.

 

            Quando John Kennedy, em seu discurso, afirmou “não pergunte o que seu país pode fazer por você, pergunte o que você pode fazer por seu país” ele defendeu a ideologia patriótica. E essa mesma frase foi usada para justificar os atos do Estado e a servidão a ele pelos cidadãos Há aí, uma inversão de posição e de valores. O Estado existe para servir a coletividade e não o contrário. Em nome da pátria, extorque-se os contribuintes com altos impostos desde que o mundo é mundo. Em nome da prosperidade do país os empresários tiram a última gota de sangue do trabalhador. Para fortalecer os meios de domínio através da servidão voluntária, ainda circula outra ideologia, a de que “o trabalho enobrece o homem”.

 

            A maioria das pessoas simplesmente adere a uma ideologia. Para escolher é preciso submeter o pensamento ao questionamento. Nenhum discurso sobrevive a uma análise crítica. Através da crítica revelam-se contradições, incoerências e incongruências. Percebe-se aquilo que está nas entrelinhas e que se pretende esconder. Para isso é preciso ter a mente aguçada pela capacidade cognitiva, hoje um atributo raro entre as pessoas.

 

            O desejo de auto-engano atualmente é tão forte, que o convencimento se dá independente da credibilidade de quem discursa, muitas vezes acolhe-se discurso de autoria desconhecida. Basta que a ideia atenda a expectativa de quem a ouve ou lê, para ser aceita. Aquilo que está sendo relatado não precisa ser verdade, não precisa ser fato, aceita-se o que está sendo dito sem provas. O critério de validação é ele estar de acordo com o que se pensa ou se acredita.

 

            Os textos trazidos à internet estão permeados de sofismas – aqueles que fogem à lógica e induz a conclusões falsas, além de falácias, ideias falsas dadas como verdadeiras.

 

            Há que resgatar ou desenvolver a capacidade de análise e crítica do que se faz, do que se lê ou se ouve, para que não se vire joguete de interesses escusos de manipulação e poder.



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Amante imaginário

Falando de amor