Cinismo – A Deturpação desse Estilo de Vida - Virgínia Leal


 

            A palavra cinismo é atribuída a um defeito ou desvio moral, mas não foi sempre assim. O Cinismo é uma corrente de pensamento filosófico, embora questione a própria filosofia, assim como faz o Sofismo. Basicamente critica a adoção das convenções sociais como algo natural. Como já foi dito, a construção do pensamento grego tem por base convenções ou acordos originários de conceitos, que são ideias aceitas como verdades.

 

 A palavra cinismo vem do grego kynismós, que significa “como um cão”. O cinismo tem por fundamento a busca da felicidade, através da adoção de uma vida natural, “como a de um cão”, que hoje seria o naturismo.

 

Diógenes, o mais importante representante desse pensamento, morava na rua e dormia num jarro. Para ele, a felicidade se alcança pelo despudor - ausência de vergonha; pela autossuficiência, que só é possível pelo despojamento de tudo que torna o indivíduo dependente; e pela ausência de paixão, que é a causa de todas as perturbações. O pudor, segundo essa teoria, é uma convenção, não é natural. Diógenes não adotava o discurso como forma de convencimento. Os seus seguidores aderiam à sua prática, sua forma de viver. Para Diógenes, despudor é falta de vergonha, é a liberdade para atender às necessidades fisiológicas, que por serem naturais e prementes, podem acontecer em qualquer hora e lugar.

 

Hoje tal prática seria duramente punida, por ser enquadrada em atentado ao pudor que tem conotação de perversão sexual. O despudor ou falta de vergonha foi desvirtuado ao longo do tempo, para hoje ser sinônimo de atrevimento, desaforo, descaramento e desfaçatez. Quem sabe isso tenha acontecido porque Diógenes contestava as convenções sociais com ironia e escárnio, chocando os ouvintes.

 

            E como essa teoria influencia a forma de viver dos tempos atuais? O pudor passou a ser uma virtude da pessoa escrupulosa, que tem uma atitude consciente, cuidadosa, cheia de zelo. Por conseguinte, o inescrupuloso é aquele desprovido de princípios morais, que tudo faz despudoramente para conseguir o que quer. A autossufuciência que antes visava a autonomia, hoje é reflexo do egoísmo, do autocentrismo. E a ausência de paixão, ou imperturbabilidade descambou para a apatia e a insensibilidade.

 

O cínico hoje, tem uma conotação pejorativa, é aquele agudo e mordaz que não respeita os sentimentos e valores estabelecidos nem as convenções sociais.

 

O que se espera de quem está no caminho de aperfeiçoamento pessoal é vencer o egoísmo, desenvolver a capacidade de sentir e aprimorar o caráter. Se de um lado a vida despudorada é inviável para o convívio social, por outro é preciso que se tenha em mente que as regras que orientam a forma adequada para prática das necessidades fisiológicas e para o polimento social nas relações não é algo natural, inerente ao ser humano, é algo aprendido, é um adestramento. O naturista só cobre o corpo quando há necessidade de se proteger do sol ou da chuva.

 

Há uma tendência crescente pela adoção de uma forma de vida natural, o que evidencia a necessidade de uma vida mais livre de convenções sociais, que são práticas impostas. Algumas são assimiladas em forma de hábito, outras são apenas reprimem a ação. Para que o ser humano seja civilizado, basta cumprir as convenções, ainda que internamente não as acolha e que as desobedeça quando tiver chance.

 

A civilidade é necessária como um pacto social de boa convivência. Mas ela em si não direciona o indivíduo para o aprimoramento pessoal. O crescimento mental, emocional e moral é uma decisão interna que exige vontade, disposição, e determinação, tendo o amor como bandeira a ser defendida para realização  da verdadeira felicidade.

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