Os Mosqueteiros (do livro Para Quem Não Tem Colírio)

    Estou na cassa de uma amiga, aguardamos seu irmão e amigos para o almoço. Ao chegarem, observo que em um deles, faltando pedaço da sobrancelha.
    - Passou no vestibular?
    - Não, cairam, assim como alguns da cabeça, é estresse.
    Fiquei intrigada de como um jovem da geração coca-cola, parecendo não estar nem aí, chega a esse nível de doença.
    Ironizei: - que grandes negócios você deixou de fechar?
    - Tudo começou quando comecei a trabalhar numa empresa de informática. Estava muito empolgado, até que houve mudanças, as metas mais apertadas. Fui excluído da equipe porque tirei licença médida, meu chefe achou que eu não era capaz de aguentar pressão. A namorada queixava-se de minha ausência, do tempo que dedicava aos amigos. Perdi o emprego e a namorada. Então começaram a cair os pelos. Pode não parecer, mas tenho vinte e cinco anos. Tinha uma meta, pretendia já ter vida estável e patrimônio formado aos vinte e oito.
    - Por que o namoro acabou?
    Depois de várias respostas que não convenceram nem a ele mesmo, respondeu:
    - Ela deixou de fumar maconha e queria que eu parasse. Tinha raiva de meus amigos porque fumam.
     - Não foi esse o motivo, interveio o amigo, ela tinha raiva porque eu o aconselhava a não faltar à faculdade para ficar com ela.

    E continuou: - Cada vez que um de nós se desvia, os outros interferem. Eu também tenho uma meta, estou na faculdade e espero ser independente financeiramente nos próximos oito anos. Não sei por que as pessoas implicam tanto com maconha, que só faz mal a quem consome. Não somos daqueles que roubam os pais.



    Fiquei surpresa ao constatar que esses jovens não eram alienados, apenas não conseguiam encaixar-se ao desumano ritmo do atual sistema produtivo. Imaginei o que seria de mim, que tantas vezes já me ausentei do serviço por problemas emocionais, estivesse hoje ingressando no mercado de trabalho. Observei que o que os une é a necessidade de proteção, a vigilância para que os excessos não os afastem de seus sonhos. Fico pensando na incoerência de pessoas ambiciosas optarem por consumir drogas, cujos efeitos cada vez mais os distanciam do sistema competitivo.



    Enquanto o lema de um por todos e todos por um for direcionado para a auto indulgência recíproca, o verdadeiro inimigo continua fazendo estragos irreversíveis.

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