Consumismo - a ideologia do mercado - Virgínia Leal



 

            A ideologia direciona a forma de ver o mundo e a reflexão em pauta é sobre a visão mercantilista das associações. O mercado é um sistema de troca que se retroalimenta,  onde operam as forças da procura e da oferta. Essa é a fonte da cultura utilitarista das relações. Ocorre que, o que antes estava circunscrito à esfera econômica, agora foi expandido às demais relações humanas. Há que entender como isso se deu.

 

            O mercado é uma engrenagem movida pelo consumo. O funcionamento dessa máquina é autoperpetuador, fomentado pela sociedade de consumidores. Nessa matriz, o indivíduo é tanto sujeito quanto objeto de consumo.

 

Ele é sujeito de consumo ao adquirir bens e serviços. E é objeto quando ele mesmo é um produto à venda. E o que o indivíduo oferece ao mercado? A força de trabalho e a produção intelectual. Esse capital profissional cresce à medida que ele é aperfeiçoado, através de aquisição de conhecimento e de experiência. Quanto mais aprimorado é seu capital, mais atrativo ele se torna para o consumo.

 

             Essa mesma lógica foi trazida para as relações sociais e até afetivas, passando a ser um componente importante na formação da identidade e personalidade do indivíduo. Está à venda a imagem, ostentada nas redes sociais, verdadeiras vitrines virtuais. Para essa imagem ser atrativa, o marketing identifica que “valores” ou capital pessoal são demandados e precisam ser adquiridos ou exibidos.

 

Se outrora essas forças de procura e oferta eram regidas pela necessidade, hoje são potencializadas pelo desejo. Sabe-se que o desejo é uma punção constante que impulsiona o indivíduo à satisfação. É também autoperpetuador, porque o vazio da falta nunca é preenchido. Quando um desejo é satisfeito, ele desloca-se para outro objeto aleatório. O marketing tem uma função determinante no fomento de desejos, a partir da criação de valores e construção de relacionamentos baseados em trocas. Ao criar valores, transforma desejos em necessidades. A propaganda encoraja desejos que são selecionados pela pesquisa de demandas. O bem a ser adquirido traz um conceito, que é mais que um significado. Quando alguém compra uma roupa “de marca”, por exemplo, ele não está apenas comprando uma vestimenta, está definindo estilo de vida e status.

 

            Essa ideologia teve fácil aceitação social, em decorrência de vários fatores. A confusão entre necessidade e desejo. O refreamento das pulsões, dos sentimentos e dos desejos encontraram no consumo uma válvula de escape. O individualismo crescente converteu as relações afetivas à lógica utilitarista. Trocou-se a necessidade de amor pela de admiração, de reconhecimento e de validação. Como esses substitutos não preenchem o vazio das necessidades reais, o impulso ao consumo se renovará, podendo chegar ao excesso, em forma de compulsão.

 

            O indivíduo, então, deixou de ser cidadão, sujeito de direitos e deveres sociais, para ser uma peça da máquina mercantilista. A ostentação deu visibilidade aos anônimos. O consumidor confunde seguidores com amigos; acumulação de bens, sucesso e status com prazer e felicidade; afetividade com busca de satisfação instantânea, efêmera e fugidia. Uma forma de vida vazia de sentido e desprovida de consistência, ou uma vida líquida, como diz Zygmunt Bauman. 


            Olhar o mundo como um mercado de trocas, onde impera o interesse e o utilitarismo nas relações, é o tipo de ideologia que nos afasta do amor, da abnegação, do serviço e da razão de viver voltada à espiritualidade. Essa é a razão do materialismo egoísta que nos distancia de Deus. Tomar consciência de como somos influenciados pelo consumismo é o primeiro passo para mudar essa realidade

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